sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

Implicações da reprovação escolar

A vítima

O dito abaixo não é resultado de pesquisas e ou leituras aprofundadas nas áreas de Psicologia, de Psiquiatria ou quaisquer conhecimentos destas áreas. São ponderações tiradas da experiência de mais de vinte anos como docente e das observações feitas em sala de aula e em todo ambiente escolar.

Somada a essa tirada, cabe minha própria experiência como reprovado, que ocorreu nos idos da década de 70, por ocasião do serviço militar compulsório. O que me disse aquele momento foi que um ano retido na escola é absolutamente prejudicial à vida, ao crescimento intelectual e é, sobretudo, inútil. Inútil para o próprio estudante, para a família, para escola e para sociedade. O resultado que percebi e senti ao ter sido reprovado é que ela – a reprovação – do ponto de vista da utilidade, teve efeito negativo. Nada, porém, foi proveitoso, senão o fato de jamais ter esquecido aquele “evento” tão grotesco.

A convivência com alguém vítima de um processo injusto é paradoxal. A sensação de ter sido vítima é aterradora. Uma se apresenta, na maioria das vezes, como culpada. A culpa que inibe a alegria, que desvirtua certos desejos e ajeita o espírito para a defensiva. O estudante reprovado passa a viver num mundo a se defender. Do professor que o ver como “repetente”, como incapaz de acompanhar a caminhada. Da família que, também, o ver como fracassado ou responsável por perdas e danos. Do “sistema”, pela impotência por não ter a quem recorrer e não poder fazer nada.

Em sala de aula o repetente não precisa de muito tempo ou esforço para demonstrar desconforto e ojeriza à condição de repetente. A expressão (tudo de novo!), é uma das primeiras manifestações, meio que envergonhada, mas esclarecedora de quem volta às aulas carimbado. E daí em diante sobram revelações torturantes. A indiferença dos colegas, dos mestres e dos anjos do poder são claras e cristalinas. No ano seguinte a ladainha se repete. Muitas vezes com os mesmos, quase sempre acompanhados de novas vítimas da insensatez que habita no nosso ensino.

Nesse quadro de indiferença diante da reprovação escolar, as perdas econômicas, as sequelas sociais e demais implicações que ela representa não inquietam a sociedade. Seria pelo fato de ela – a sociedade – já estar tão viciada em outras tantas iniquidades?

Mas o que é mais incoerente nisso tudo é a escola não dizer nada sobre essa questão. Se a escola, responsável direta pela reprovação, sequer pisca para ela, quem haveria de perder o sono por alguém que “não quer estudar”, que é “incapaz”, ou que precisa “ser punido para aprender”?

Um comentário:

  1. Bem elucidativo este artigo meu querido amigo professor Raimundo.
    Obrigado pelo carinho

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