sábado, 9 de dezembro de 2023

A eleição nas escolas públicas e o silêncio dos culpados


Nonato Menezes

Que nossas elites não querem que sejamos um país democrático é do conhecimento até das folhas verdes. Para provar isso, basta um instante de nossa História. Os golpes se sucedem, sejam com tanques nas ruas ou com um dublê mal ajambrado de parlamentar. Os efeitos são os mesmos.

O sistema político, em geral, e o eleitoral, em particular, não avançam um milímetro nos caminhos da decência. Se por alguma razão, um passo é dado à frente, onze são dados em direção ao atraso. No que se refere em busca da Democracia, vivemos sempre um “eterno retorno”. Para bem exemplificar tal situação, vale aqui a conhecida metáfora do “cachorro que roda atrás do próprio rabo”.

Boas intenções e oportunidades não faltam para que os avanços democráticos sejam sentidos, mesmo sendo a passos lentos.

Já não creio que eleger vereador, deputado, prefeito ou presidente da república seja o melhor e o único caminho para se conquistar a Democracia. O vereador eleito já é um adulto, cheio de vícios e espertezas. A maioria, se não é, vira artista e faz do parlamento um balcão para seus negócios e suas tramas. Nada do que interessa ao público faz parte do jogo. É assim que o “sistema” se produz e se reproduz.

Também, não creio que outras instituições como os sindicatos de trabalhadores, por exemplo, cujo processo eleitoral é um momento importante para sossegar os ânimos, sejam alternativas seguras e confiáveis para a conquista democrática. Assim como o vereador, o sindicalista, a despeito de sua convivência com o conflito, carrega os mesmos vícios que o parlamentar, pois não consegue saltar a vala comum do conservadorismo, nem fugir das disputas mesquinhas em defesa de interesses particulares, muitas vezes escusos.

Não fosse essa mácula, os mais de dez mil sindicatos de trabalhadores que temos; a maioria forjada na inegável luta de classes, teríamos uma massa capaz de fazer nossas elites engolirem o golpe, e, no mínimo, fazer valer a escolha popular legítima do pleito de 2014.

Evidente que não devemos prescindir do parlamento, das instituições sindicais, nem daqueles escolhidos pela população para governarem municípios, estados e a união. Se tem sido difícil assim, certamente, sem esses mecanismos, a vida seria bem pior.

Mas enquanto a vida não se esvai, sobra a esperança. Aquela esperança que alimenta os sonhos. E o sonho que cultivo é que a escola pública seja a precursora das conquistas democráticas, pois é nela que reside a salvação de nosso povo.

Por poucas razões.

É na escola que o espaço público melhor se apresenta à criança, ao adolescente, a todos nós. Na escola os valores democráticos melhor podem florescer, porque é o espaço criado pela vida humana para se ensinar e para se aprender. Antes de tudo, aprender e ensinar a ser democrático.

Na atual conjuntura do Distrito Federal, vivemos um bom e oportuno momento para conversarmos sobre isto. Em poucos dias teremos eleições para gestores das escolas públicas. Direta e indiretamente, mais de um milhão de pessoas estarão envolvidas nesse processo.

É um momento que sugere conquistas democráticas, e a possibilidade de escolha de um gestor público pela comunidade escolar é uma delas.  E mais que a escolha do gestor, o processo deveria ser o momento mais importante para descortinar as conquistas democráticas.

Contudo, assim como nossas elites, aqui também há quem não prefira, mesmo que de forma dissimulada, uma sociedade democrática e, por consequência, uma escola com valores democráticos.

O atual governo, através de sua Secretaria de Educação, não sopra um dente de leão para que o processo seja o mais democrático possível. No máximo, cumpre o ritual que a lei exige, mas se puder atrapalhar, o faz com a maior desfaçatez, como tem sido demonstrado.

Nossa câmara legislativa, cujos membros vivem a cantar que ali é a “Casa do Povo”, deu sua contribuição para piorar o que já era ruim: mudou a lei para beneficiar um grupo de diretores interessado em permanecer eternamente na gestão escolar. Um golpe diferenciado.
Os atuais gestores e escolas inteiras se submetem a vícios e tramas que nada têm a ver com que o momento sugere e exige, não se dando conta de que ali é um espaço público, onde se deveria aprender e ensinar valores democráticos.

Um exemplo dessa picaretagem é a supressão, na maioria das escolas, dos debates tão necessários para a mobilização e o envolvimento da comunidade no processo e para dar transparência às ações e aos interesses dos postulantes à gestão pública.

A falta de pudor não é percebida apenas na sofreguidão da disputa, quando há, mas nas próprias orientações dadas pelos “organizadores” do processo eleitoral, haja vista este parágrafo de um documento expedido pela Comissão Regional Eleitoral de Taguatinga para orientar os procedimentos da vergonhosa “audiência pública” a se realizar em cada escola.


Então... seria esta uma medida legal para evitar que o diretor/concorrente seja cobrado a prestar contas do dinheiro recebido de uma operadora de telefonia celular pela antena instalada dentro dos muros da escola ou em suas imediações, ou para evitar que o diretor/concorrente tenha que explicar a venda de período de coordenanação? Será possível que tenha algo mais que não deva ser tornado público, sob pena de o Ministério Público, tão cioso com a moralidade, vir a denunciar?

Por fim a participação do nosso Sinpro/DF. Do nosso combativo Sindicato dos Professores no Distrito Federal nesse processo que de “democrático” só tem o nome.

O Sinpro/DF foi a instituição que mais se empenhou para que a Lei 4.751/2012 – da Gestão – fosse elaborada, votada, sancionada e executada.

Mas o Sinpro/DF parou aí. Parece que o entendimento dos diretores e das diretoras do sindicato é a de que a Lei sozinha encaminha a democratização das relações escolares. Se for esse o entendimento, eles estão certos, pois nem mesmo a diretoria encontrou o veio da democratização da escola.

A intervenção necessária para que o debate aconteça, para que os erros da legislação sejam corrigidos e para que a escola saia da inércia política em que se encontra o Sinpro não tem feito. E parece que não virá a fazer, pois a depender das publicações na página da instituição, o discurso aponta para a total ausência de seus diretores no processo político eleitoral da rede pública de ensino.

Mas o entendimento conservador é este mesmo, o de achar que a sociedade se democratiza sozinha, sem a intervenção das instituições e de suas lideranças.

Os professores de Brasília construíram um sindicato que sempre repudiou a tese da função assistencialista defendida pela ditadura militar e nossas elites. Nos dias de hoje, a direção do Sinpro-DF pensa que o melhor que pode fazer pela categoria é estabelecer convênios com agências de turismo, lojas comerciais diversas, postos de gasolina etc., e ainda canta esse tipo de ação como um grande feito. Essa diretoria por não fazer autocrítica, ressente-se muito das críticas, acha presunçoso quem as faz e foge dos conflitos como gato escaldado foge de água fria.

E o pior de tudo é que com esta conduta está matando o debate.

Assim, a diretoria do Sinpro se soma aos dirigentes da Secretaria de Educação, à maioria dos diretores e diretoras de escolas e aos diretores das regionais de ensino num pacto de silêncio, isto num momento em que, graças às circunstâncias em que vivemos, mais se necessita do debate, do envolvimento, do esclarecimento, da denúncia e da cobrança por transparência nos serviços públicos.

Portanto, não atiçar o conflito é o mesmo que silenciar e omitir-se. Quem adota esta postura deve assumir a culpa pela não democratização das nossas escolas. E é o que deve fazer o nosso sindicato e os responsáveis pelo sistema de ensino público do Distrito Federal.

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